Para Estudos e Pesquisas
Área Temática: História da Educação
Agência Financiadora: Não contou com financiamento
Resumo
O tema desta comunicação – as funções sociais da escola – é resultante de uma pesquisa de
cunho bibliográfico desenvolvida na disciplina Ciência, História e Educação. Tem por
objetivo identificar as funções sociais da escola sob a perspectiva de cinco autores. Com esse
intuito, analisamos o artigo de Pierre Bourdieu (1999) – A Escola Conservadora: as
desigualdades frente à escola e à cultura – no qual o autor explicita os mecanismos objetivos
que determinam a função social da escola sob a ótica da conservação das desigualdades e da
reprodução das classes sociais; a obra de Pérez Gómez (1998) – As Funções Sociais da
Escola: da reprodução à reconstrução crítica do conhecimento e da experiência – que vê, na
escola, um espaço no qual a função reprodutivista pode ser quebrada pela priorização da
função educativa; Dermeval Saviani em Educação: do senso comum à consciência filosófica
(1980) e Escola e Democracia (1983) destaca que a função social da escola é promover o
homem, elaborando, a partir daí, um método que permitiria à escola exercer tal função.
Antonio Gramsci (1979) em Os Intelectuais e a Organização da Cultura propõe a escola
unitária e desinteressada. Com A Produção da Escola Pública Contemporânea Gilberto Luiz
Alves (2001) demonstra como as funções reprodutivista e pedagógica foram secundarizadas,
cedendo espaço a novas funções. Embora os caminhos metodológicos seguidos por estes
pensadores sejam, em alguns casos, divergentes, suas análises convergem, sob uma dimensão:
a escola deve resgatar o conhecimento historicamente acumulado e assumir a função de
possibilitar, aos trabalhadores, o acesso a esse conhecimento.
Palavras-chave: Função Social da Escola. Reprodução e Conservação Social.
Transformação. Promoção do Homem. Escola Única e Desinteressada.
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Introdução
Esse estudo tem por objetivo identificar as funções sociais da escola sob as lentes de
cinco historiadores: Pierre Bourdieu (1999), Pérez Gómez (1998), Dermeval Saviani (1980,
1983), Antônio Gramsci (1979, 1989) e Gilberto Luiz Alves (2001). Este trabalho é o
resultado de uma pesquisa bibliográfica realizada na disciplina Ciência, História e Educação1
que buscou responder à seguinte questão: quais as funções sociais que permearam o
desenvolvimento da escola pública? Entender essas funções implicou nessa pesquisa
bibliográfica com o objetivo de explicitar as funções sociais da escola sob a lente de
diferentes autores.
O sociólogo francês, Pierre Bourdieu, explicita, em seu artigo, os mecanismos
objetivos que determinam a função social da escola: conservar as desigualdades e reproduzir
as classes sociais. Pérez Gómez também afirma que a escola é conservadora e reprodutora,
contudo acredita que ela pode ser, além disso, um espaço de transformação.
Dermeval Saviani (1980, 1983) atribui à escola a função de promover o homem e,
nessa perspectiva, propõe melhorias profundas na formação docente e no ensino discente.
Para tanto desenvolveu um método de ensino para as escolas brasileiras no qual a apropriação
do conhecimento historicamente acumulado é o ápice.
Antônio Gramsci (1979, 1989) propõe uma escola unitária e desinteressada, uma
escola que não aja de forma imediatista, mas desinteressadamente, conduzindo o aluno ao
hábito de estudar, analisar, raciocinar e abstrair.
Preconizando uma nova didática, Gilberto Luiz Alves (2001) demonstra como as
funções reprodutivista e pedagógica foram secundarizadas na escola cedendo espaço às novas
funções geradas pelo desenvolvimento tecnológico.
A Escola Conservadora
Para Bourdieu (1999, p. 41) o sistema escolar “é um dos fatores mais eficazes de
conservação social, pois fornece a aparência de legitimidade às desigualdades sociais, e
sanciona a herança cultural e o dom social tratado como dom natural”. Conforme Bourdieu
1
Disciplina ministrada no segundo semestre de 2007, pelos professores Ângela Mara de Barros Lara e Mário
Luiz Neves de Azevedo, no Programa de Pós – Graduação em Educação/Doutorado, pela Universidade Estadual
de Maringá – UEM, da qual participei como aluna especial.
1315
(1999, p. 41/42), é a herança cultural a primeira responsável pela diferença inicial da criança
na escola, uma vez que cada família transmite a seus filhos certo capital cultural e certo ethos
– sistema de valores – que contribui para definir, entre outras coisas, as atitudes face ao
capital cultural e à instituição escolar. Assim, quanto mais elevada for a categoria sócio-
profissional e, conseqüentemente, o nível cultural dos pais e dos avós, mais se elevam as
probabilidades de êxito escolar da criança.
Não é só a compreensão e o manejo da língua que garantem maior rentabilidade
escolar aos filhos das classes superiores, afirma Bourdieu. Eles herdam, além dos saberes,
gostos e “bom gosto” – práticas e conhecimentos culturais (teatro, museu, pintura, música,
jazz, cinema) – tão mais ricos e extensos quanto mais elevada for sua origem social. E a
escola, pelas desigualdades de seleção e pela ação homogeneizante, só faz reduzir
minimamente essas diferenças, contribuindo para a reprodução da “estrutura das relações de
classe ao reproduzir a desigual distribuição, entre as classes, do capital cultural”
(BOURDIEU, 1975, p. 198). Ao atribuir aos indivíduos esperanças de vida escolar
estritamente dimensionadas pela sua posição social, a escola opera uma seleção que sanciona
e consagra as desigualdades reais. Com isso, contribui para perpetuar as desigualdades, ao
mesmo tempo em que as legitima.
A herança cultural, dada pela posição social, influencia tanto a taxa de êxito escolar e
a continuidade do ensino quanto a escolha do destino. No entanto, alerta Bourdieu (1999),
essa situação não se deve ao dom natural ou a um destino determinado, mas às desigualdades
sociais que geram as desigualdades culturais. Se a combinação do capital cultural e do ethos,
legados pelo meio familiar, constituem o princípio de eliminação diferencial das crianças de
diferentes classes sociais, é a atitude da família a respeito da escola que determina o
prosseguimento ou não dos estudos. As vantagens e desvantagens sociais são,
progressivamente, convertidas em vantagens e desvantagens escolares. Ao tratar todos os
educandos como iguais em direitos e deveres, a escola sanciona as desigualdades iniciais
frente à cultura e “consegue tão mais facilmente convencer os deserdados que eles devem seu
destino escolar e social à sua ausência de dons e de méritos” (BOURDIEU, 1975, p.218). Para
Bourdieu (1999, p. 53), a igualdade formal que pauta a prática pedagógica mascara a
indiferença frente às desigualdades reais e dirige-se tão somente aos educandos que detêm
uma boa herança cultural, de acordo com as exigências culturais da escola.
1316
Isso ocorre porque a cultura escolar é tão próxima da cultura da elite que as crianças
das classes populares não podem adquirir, senão com muito esforço, o que é herdado, pelos
filhos das classes cultivadas. Assim, a função da escola – organizar o culto de uma cultura –
só pode ser proposta a todos, mas, de fato, está reservada aos membros das classes às quais
pertence a cultura cultuada. Nesse contexto, a escola assume por função objetiva conservar os
valores que fundamentam a ordem social dominante. A essa prática cultural se oporia
[...] uma pedagogia racional e universal, que, partindo do zero e não considerando
como dado o que apenas alguns herdaram, se obrigaria a tudo a favor de todos e se
organizaria metodicamente em referência ao fim explícito de dar a todos os meios de
adquirir aquilo que não é dado, sob a aparência de dom natural, senão às crianças
das classes privilegiadas (BOURDIEU, 1999, p. 53).
No entanto, a ação da escola não se dirige no sentido de dar a todos os meios de
adquirir aquilo que não lhes é dado. Ela é o lugar de transmissão do saber que recebe e trata
os alunos como iguais, a despeito da disparidade cultural. Com isso sanciona as desigualdades
que só ela poderia reduzir. Considerando que o domínio da cultura erudita requer o
conhecimento do código segundo o qual ela está codificada e que o domínio do código só
pode ser adquirido mediante uma aprendizagem metódica e organizada caberia à instituição
escolar “desenvolver em todos os membros da sociedade, sem distinção, a aptidão para
práticas culturais que a sociedade considera como as mais nobres” (BOURDIEU, 1999, p.
62).
Bourdieu analisa a função reprodutivista da escola que, embora aja no sentido de
conservar as desigualdades e reproduzir as classes sociais, poderia ser também um espaço de
socialização caso lutasse por um trabalho no qual oferecesse aos filhos das classes populares
condições de adquirir o capital cultural que não herdaram. Porém, o autor francês considera
ingenuidade supor que do funcionamento da escola, tal como está organizada, possam surgir
as contradições capazes de determinar uma transformação profunda “e de impedir a
instituição encarregada da conservação e da transmissão da cultura legítima de exercer suas
funções de conservação social” (BOURDIEU,1999, p. 58).1317
3 Conservação e Reprodução ou Transformação?
Conforme Pérez Gómez (1998, p. 13), o ser humano, desde suas origens, elabora
mecanismos para sua sobrevivência que são transmitidos às novas gerações. “Este processo
de aquisição por parte das novas gerações das conquistas sociais – processo de socialização –
costuma denominar-se genericamente como processo de educação”. Nesse sentido, a
educação assume a função de socialização e, em especial, de humanização do homem. Nas
sociedades atuais a preparação das novas gerações está sob a responsabilidade de instâncias
específicas como a escola, cuja função é preparar as “novas gerações para sua participação no
mundo do trabalho e na vida pública” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 13), ou seja, promover sua
socialização.
A escola, concebida como instituição socializadora das novas gerações, cumpre uma
função puramente conservadora: “garantir a reprodução social e cultural como requisito para a
sobrevivência da sociedade” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 14). No entanto, alerta o autor, a
tendência conservadora lógica para a reprodução social choca-se com outra tendência,
também lógica, que busca transformar os caracteres sociais, especialmente aqueles
desfavoráveis para alguns grupos, caracterizando uma contradição externa. Nesse contexto, o
processo de socialização que a escola cumpre assume dois objetivos: preparar os alunos para
o futuro ingresso no mercado de trabalho e formar o cidadão para sua intervenção na vida
pública, emergindo daí as contradições internas que consagram a escola como reprodutora da
arbitrariedade cultural. Explica-se.
Com o intuito de formar o cidadão capaz de intervir na vida pública a escola deve
provocar o desenvolvimento de conhecimentos, idéias, atitudes e pautas que permitam sua
incorporação na vida política e social, esferas que requerem “participação ativa e responsável
de todos os cidadãos considerados por direito como iguais” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 20).
Contraditoriamente essa mesma sociedade, na esfera econômica, induz à submissão, à
disciplina e à aceitação das diferenças sociais. Nessa esfera a contradição agrava-se: a escola
deve formar os alunos para sua futura incorporação em que mercado de trabalho? Do trabalho
assalariado que requer submissão e disciplina? Ou do trabalho autônomo que, ao contrário,
requer atividade e criatividade?
Frente a uma função tão complexa e contraditória a escola apresenta
1318
[...] uma ideologia tão flexiva, frouxa e eclética [...] cujos valores são o
individualismo, a competitividade, a falta de solidariedade, a igualdade formal de
oportunidades e a desigualdade “natural” de resultados em função de capacidades e
esforços individuais. Assume-se a idéia de que a escola é igual para todos e de que,
portanto, cada um chega onde suas capacidades e seu trabalho pessoal lhes permitem
(PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 16).
Esse processo consagra a escola como reprodutora da arbitrariedade cultural num meio
que estimula a competitividade, em detrimento da solidariedade, desde os primeiros
momentos da aprendizagem escolar. Confirmando os dizeres de Bourdieu, Pérez Gómez
(1998, p. 16) conclui que a escola socializa preparando o cidadão para aceitar como natural a
arbitrariedade cultural. Porém, o processo de reprodução nem é linear, nem automático, nem
isento de contradições e resistências; o processo de socialização acontece também em
conseqüência das práticas sociais. A escola é um cenário de conflitos.
Para Pérez Gómez (1998, p. 19) na escola, como em qualquer outra instituição social,
existem espaços de relativa autonomia que podem ser usados para desequilibrar a tendência
reprodutora, uma vez que o processo de socialização envolve um complexo movimento de
negociação em que as reações e resistências de professores/as e alunos/as podem chegar a
provocar a recusa e ineficiência das tendências reprodutoras da escola.
A contradição externa – tendência conservadora x tendência renovadora – acontece de
forma específica na escola. As correntes renovadoras impulsionam a resistência e a
transformação. A função educativa da escola, ou seja, a utilização do conhecimento social e
historicamente construído, da experiência e da reflexão como ferramentas de análise para
compreender a sociedade e a ideologia dominante, quebra ou pode quebrar o processo
reprodutivista. O grande desafio da escola é fazer com que sua função educativa assuma um
caráter compensatório, isto é, atenda às diferenças de origem, oportunizando o acesso à
cultura, provocando e facilitando a reconstrução dos conhecimentos, das disposições e das
pautas de conduta que a criança assimila em sua vida paralela e anterior à escola.
A escola, afirma o autor, não pode anular a desigualdade socioeconômica, mas pode
atenuar seus efeitos. Para tanto, deve oferecer o conhecimento como ferramenta de análise e,
mais que transmitir informação, deve orientar
1319
[...] para provocar a organização racional da informação fragmentaria recebida e a
reconstrução das pré-concepções acríticas formadas pela pressão reprodutora do
contexto social. [...] É preciso transformar a vida da aula e da escola, de modo que
se possam vivenciar práticas sociais e intercâmbios acadêmicos que induzam à
solidariedade, à colaboração, à experimentação compartilhada, assim como a outro
tipo de relações com o conhecimento e a cultura que estimulem a busca, a
comparação, a crítica, a iniciação e a criação (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 26).
Assim como Bourdieu, Pérez Gómez afirma que a escola exerce uma função de
reprodução cultural e de conservação social. Porém, ele acredita na existência de um espaço
de autonomia no qual a resistência pode gerar transformações. Além da função de
conservação e de reprodução a escola pode, através de sua função educativa, estimular a
participação ativa e crítica dos alunos, primeiramente nas atividades desenvolvidas na sala de
aula e, posteriormente no cenário social propriamente dito.
A Escola como Promotora do Homem
A Importância da Afetividade na Relação Professor/Aluno no
Processo de Ensino/Aprendizagem na Educação Infantil
Tágides Mello 1
2
Juliana de Alcântara Silveira Rubio
Resumo
Este trabalho pretende abordar a afetividade como
fator imprescindível no processo de ensino
aprendizagem, pois age de forma positiva na vida
educacional. Através do afeto, o aluno adquire
todas as condições necessárias para se sentir
seguro e protegido. Assim, para que tenha um
desenvolvimento saudável e adequado dentro do
ambiente escolar é necessário estabelecer
relações positivas, para se atingir os objetivos
educativos.
Palavras Chave: Afetividade; relação professor-aluno; aprendizagem.
1. Introdução
Esta pesquisa trata da importância da afetividade para os educandos da
Educação Infantil, por entender que o indivíduo que é tratado com afeto pode
transformar-se em um ser humano capaz de enfrentar os problemas da vida e tem
maior possibilidade de tornar-se uma pessoa mais solidária, mais centrada. Nesse
contexto observamos também que o educador tem que fazer sua parte, procurando
estar emocionalmente equilibrado, para poder intervir nos conflitos que surgem em
sua sala de aula. Um bom relacionamento entre professor e aluno, pautado no
respeito e no carinho favorece essa mediação.
Ao perceber a importância de uma relação afetiva positiva entre professor-
aluno para o processo e desenvolvimento da aprendizagem da criança, sentimos a
necessidade de desenvolver uma pesquisa a fim de verificar se o fortalecimento das
relações afetivas entre ambos contribui para um melhor rendimento escolar.
Acreditamos que o professor não apenas transmite conhecimentos, mas também
pode estabelecer uma relação afetiva com seus alunos, o que facilitaria o processo
de aprendizagem.
1
Pós-graduando em Psicopedagogia pela Universidade Nove de Julho – UNINOVE.
2
Mestre em Educação pela Universidade Estadual Paulista – UNESP – Professora orientadora.
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
2
O trabalho foi baseado em autores como Freire (1996), Piaget (1995), La
Taille (1992), Saltini (2008), e subsidiado por várias citações destes autores, mestres
na arte de educar.
2. Afetividade
Uma das dificuldades no estudo sobre a afetividade é a definição do que
realmente significa o termo. Na linguagem geral, afeto relaciona-se com sentimentos
de ternura, amor, carinho e simpatia. A afetividade está relacionada aos mais
diversos termos: emoção, estados de humor, motivação, sentimento, paixão,
atenção, personalidade, temperamento e outros tantos. A maior parte das vezes,
confundida com emoção.
A afetividade exerce um papel importantíssimo em todas as relações, além de
influenciar decisivamente a percepção, o sentimento, a memória, a autoestima, o
pensamento, a vontade e as ações, e ser, assim, um componente essencial da
harmonia e do equilíbrio da personalidade humana.
Os estados afetivos fundamentais são as emoções, os sentimentos, as
inclinações e as paixões. A palavra emoção vem do latim movere, mover-se para
fora, externalizar-se. É a máxima intensidade do afeto.
A emoção é definida assim, pelo Dicionário Aurélio (1994): “Psicol. Reação
intensa e breve do organismo a um lance inesperado, a qual se acompanha de um
estado afetivo de conotação penosa ou agradável”.
Segundo a Wikipédia, “a afetividade é a relação de carinho ou cuidado que se
tem com alguém íntimo ou querido”. É o estado psicológico que permite ao ser
humano demonstrar as suas emoções e sentimentos a outro ser. É considerado
também o laço criado entre humanos com uma amizade mais aprofundada.
Afeição (vinda de afeto), é representada por um apego a alguém, o que gera
carinho, saudade, confiança e intimidade, o termo perfeito para amor entre duas
pessoas. O afeto é um dos sentimentos que mais gera autoestima entre pessoas.
Afeto significa afeição; amizade; amor e designa um estado da alma, um
sentimento; é uma mudança ou modificação que ocorre simultaneamente no corpo
e na mente de alguém. A maneira como somos afetados pode diminuir ou aumentar
a nossa vontade de agir.
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
3. A Afetividade na Educação Infantil
Para que se possa compreender de forma mais ampla o tema da afetividade
na educação infantil, entendemos que primeiramente faz-se necessário tratar
rapidamente sobre a educação infantil.
A Educação Infantil foi vista durante um grande tempo como uma forma de
cuidar, sendo assim deixada em segundo plano, não contando com nenhuma
preocupação no que diz respeito ao caráter pedagógico que está inserido em todo
contexto educacional.
Porém, atualmente, muito se discute sobre Educação Infantil. A Educação
Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança. Conforme a LDB- Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei Federal nº 9394/96)- colocando-a na mesma importância com o Ensino
Fundamental e Médio. Sobre a Educação Infantil, especificamente, a LDB se
expressa assim:
“A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
ação da família e da comunidade.” (LDB, CAP.II; SEÇÃOII; ART.29- LDB)
Falando de qualidade na educação infantil, como já vimos, a questão da
afetividade passa a fazer parte da rotina e cotidiano educacional. Estudos realizados
deixam claro que a afetividade está ligada intimamente ao aprendizado infantil,
sendo que as emoções e os sentimentos foram muito estudados por importantes
teóricos.
Segundo La Taille (1992), Jean Piaget (1896-1980) foi um dos primeiros
autores que questionou as teorias sobre a afetividade e a cognição como aspectos
funcionais separados. Para Jean Piaget, “o desenvolvimento intelectual é
considerado como tendo dois componentes: o cognitivo e o afetivo”. Paralelo ao
desenvolvimento cognitivo está o desenvolvimento afetivo. Afeto inclui sentimentos,
interesses, desejos, tendências, valores e emoções em geral. Conforme Piaget
(1995) elas são inseparáveis, pois, defende que toda ação e pensamento
comportam um aspecto cognitivo, representado pelas estruturas mentais, e um
aspecto afetivo, representado por uma energética, que é a afetividade. Ou seja, “a
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
4
afetividade constitui aspecto indissociável da inteligência, pois ela impulsiona o
sujeito a realizar as atividades propostas”. Segundo La Taille (1992) “os educandos
alcançam um rendimento infinitamente melhor quando se apela para seus interesses
e quando os conhecimentos propostos correspondem às suas necessidades”.
Vygotsky (apud LA TAILLE, 1992), propôs a construção de uma nova
psicologia, fundamentada no materialismo histórico e dialético. Aprofundou seus
estudos sobre o funcionamento dos aspectos cognitivos, mais precisamente as
funções mentais e a consciência. Vygotsky usa o termo função mental para referir-
se a processos como pensamento, memória, percepção e atenção. A organização
dinâmica da consciência aplica-se ao afeto e ao intelecto.
Conforme Oliveira (1992, p. 76), Vygotsky explica que o pensamento tem sua
origem na esfera da motivação, a qual inclui inclinações, necessidades, interesses,
impulsos, afeto e emoção. Nesta esfera estaria a razão última do pensamento e,
assim, uma compreensão completa do pensamento humano só é possível quando
se compreende sua base afetivo-volitiva. Apesar de a questão da afetividade não
receber aprofundamento em sua teoria, Vygotsky evidencia a importância das
conexões entre as dimensões cognitiva e afetiva do funcionamento psicológico
humano, propondo uma abordagem unificadora das referidas dimensões.
Por sua vez, na psicogenética de Henri Wallon (apud LA TAILLE 1992), a
dimensão afetiva está no centro de tudo, tanto do ponto de vista da construção da
pessoa quanto do conhecimento. Para ele, a afetividade é fator fundamental no
desenvolvimento da pessoa, é por meio dela que o aluno exterioriza seus desejos e
suas vontades.
Desde pequeno, recém nascido, o ser humano utiliza a emoção para
comunicar-se com o mundo. O bebê, antes mesmo da aquisição da linguagem,
estabelece relação com a mãe, através de movimentos de expressão, choro, que é
uma produção cultural, e os movimentos e gestos são carregados de significados
afetivos, sendo expressões da necessidade alimentar e do humor.
Como diz Dantas (1992), para Wallon, “O ato mental se desenvolve a partir do
ato motor; personalismo ocorre dos três aos seis anos”. Nesse estágio desenvolve-
se a construção da consciência de si mediante as interações sociais, reorientando o
interesse das crianças pelas pessoas.
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5
Henri Wallon foi o primeiro a levar não apenas o corpo da criança, mas
também suas emoções, para dentro da sala de aula. Suas idéias foram baseadas
em quatro elementos básicos que se comunicam o tempo todo: a afetividade, o
movimento, a inteligência e a formação do eu como pessoa.
Segundo Wallon (apud DANTAS,1992), a afetividade é anterior ao
desenvolvimento, e as emoções têm papel predominante no desenvolvimento da
pessoa, é por meio delas que o aluno exterioriza seus desejos e suas vontades. As
transformações fisiológicas de uma criança revelam traços importantes de caráter e
personalidade. A raiva, a alegria, o medo, a tristeza têm funções importantes na
relação da criança com o meio, a emoção causa impacto no outro e tende a se
propagar no meio social, pois é altamente orgânica. Desta forma, nessa teoria,
acredita-se que a afetividade é um ponto de partida para o desenvolvimento do
indivíduo.
Wallon destaca a alternância existente entre as funções razão (cognitiva) e
emoção (afetividade), apresentadas no decorrer do desenvolvimento da pessoa. A
razão e a emoção estão imbricadas, ou seja, uma não acontece sem a outra, mas
sempre uma se sobrepõe à outra.
Dantas (1992) enfatiza que, além de ser uma das dimensões da pessoa, a
afetividade é também a mais arcaica fase do desenvolvimento. Afirma que no início
da vida, afetividade e inteligência estão misturadas com predomínio da primeira.
Conclui que o ser humano, desde o nascimento, é um ser afetivo, e que
gradativamente, esta afetividade inicial vai diferenciando-se em vida racional.
Wallon, Vygotsky e Piaget afirmam que não se pode separar afetividade e
cognição. Apontando os estudos feitos por eles, pode-se afirmar que a afetividade é
vital em todos os seres humanos, de todas as idades, mas, especialmente, no
desenvolvimento infantil. A afetividade está sempre presente nas experiências
vividas pelas pessoas, no relacionamento com o “outro social”, por toda sua vida,
desde seu nascimento.
Quando a criança entra na escola, torna-se ainda mais evidente o papel da
afetividade na relação professor-aluno.
4. A Afetividade na Relação Professor-Aluno
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
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Educar não significa apenas repassar informações ou mostrar um caminho a
trilhar que o professor julga ser o certo. Educar é ajudar o aluno a tomar consciência
de si mesmo, dos outros, da sociedade em que vive e o seu papel dentro dela. É
saber aceitar-se como pessoa e principalmente aceitar ao outro com seus defeitos e
qualidades.
Muitos autores vêm, ao longo da história, defendendo que o afeto é
indispensável para o ato de ensinar. Embora os fenômenos afetivos sejam de
natureza subjetiva, isso não os torna independentes da ação do meio sóciocultural,
pois pode-se afirmar que estão diretamente relacionados com a qualidade das
interações e relações entre sujeitos, enquanto experiências vivenciadas.
Rubem Alves (2000) enfatiza que o professor, aquele que ensina com alegria,
que ama sua profissão, não morre jamais. Ele diz:
“Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a
viver naquele cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa
palavra. O professor, assim, não morre jamais...” (ALVES, 2000 p.5)
Em sala de aula tenta-se descobrir qual é o papel do professor, direcionando
o olhar para a relação que se desenvolve entre professor e aluno.
As interações em sala de aula são construídas por um conjunto de variadas
formas de atuação, que se estabelecem entre partes envolvidas, a mediação do
professor em sala de aula, seu trabalho pedagógico, sua relação com os alunos,
tudo faz parte desse papel. A afetividade não se limita a carinho físico, muitas vezes
se dá em forma de elogios superficiais, ouvir o aluno, dar importância às suas idéias.
É importante destacar essa forma de afetividade, pois às vezes nem percebemos
que pequenos gestos e palavras são maneiras de comunicação afetiva.
SILVA (2001) enfatiza a importância do professor para que os alunos sintam-
se mais seguros, criando, assim, um ambiente de aprendizado tranquilo, pois a
afetividade se faz presente no cotidiano da sala de aula, seja pela postura do
professor, pela dinâmica de seu trabalho ou nas interações entre sujeitos.
Todas as ações são mediadas pela afetividade do professor e percebe-se que
as decisões tomadas por ele têm respaldo da afetividade, constituindo o afeto como
fator fundante das relações que se estabelecem entre os alunos, os conteúdos
escolares e os professores.
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O ato de ensinar e de aprender envolve e exige certa cumplicidade do
professor, tal cumplicidade se constrói nas intervenções, através do que é falado, do
que é entendido, do que é transmitido e captado. Cabe ao professor planejar e
executar suas aulas para que seus alunos criem vínculos positivos entre si e os
conteúdos. Quando um professor apenas transmite um conteúdo, sem nexo, sem
que o aluno assimile afetivamente o conteúdo, nada será aprendido pois o professor
tem de tornar os conteúdos interessantes aos olhos dos alunos.
Pequenos gestos como sorrir, escutar, refletir, respeitar são, entre tantos
outros, necessidades que levam o sujeito a investir na afetividade, que é o
“combustível” necessário para a adaptação, a segurança, o conhecimento e o
desenvolvimento da criança.
Em se tratando da educação infantil, a relação do professor com os alunos é
constante, dá-se o tempo todo, na sala, durante as atividades, no pátio, e por essa
proximidade afetiva é que se dá interação com objetos e a construção do
conhecimento.
SALTINI (2008, p.100) afirma que, “essa inter-relação é o fio condutor, o
suporte afetivo do conhecimento.”
O referido autor complementa:
“Neste caso, o educador serve de continente para a criança. Poderíamos
dizer, portanto, que o continente é o espaço onde podemos depositar
nossas pequenas construções e onde elas são acolhidas e valorizadas, tal
qual um útero acolhe um embrião. A criança deseja e necessita ser amada,
aceita, acolhida e ouvida para que possa despertar para a vida da
curiosidade e do aprendizado.” (SALTINI, 2008, p.100)
As experiências afetivas nos primeiros anos de vida são determinantes para
que a pessoa estabeleça padrões de conduta e formas de lidar com as próprias
emoções, a qualidade dos laços afetivos é muito importante para o desenvolvimento
físico e cognitivo da criança. A relação interpessoal positiva que o aluno constrói
com o professor, como aceitação e apoio, possibilita o sucesso dos objetivos
educativos.
Quando ocorrem explosões de raiva, o professor precisa ter muita habilidade
e paciência e seria ótimo manter um diálogo com o aluno, em que se possa perceber
o que está acontecendo, usando tanto o silêncio quanto o corpo. Conforme
recomenda Saltini (2008 p.102) compartilhar com os demais da classe os
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sentimentos que estão sendo evidenciados é dar oportunidade para a criança
colocar seus sentimentos na escola, não apenas sua inteligência.
O afeto é muito importante para que o profissional seja considerado um bom
professor e mais ainda, para que o aluno se sinta importante e valorizado. O
professor deve entender seus sentimentos, buscar soluções para as diversas
dificuldades que os alunos apresentam, preocupar-se com seus alunos por inteiro,
tendo sensibilidade para entendê-los, buscar ações que os valorizem, independente
de seu grau de desenvolvimento.
Nessa visão, a criança interioriza suas vivências, principalmente pelo contato
social com outras pessoas. Sendo assim, se seu círculo social tratá-la com carinho,
reconhecer seus direitos e se mostrar atencioso, a criança interiorizará um bem-
estar emocional, sentindo-se protegida e segura de seu espaço dentro do grupo.
Wallon (apud La Taille, 1992), em sua teoria da emoção, considera a
afetividade e inteligência fatores misturados, e defende que a educação da emoção
deve ser incluída entre os propósitos da ação pedagógica.
Esse estudioso analisou que no início da vida, a afetividade se sobressai. Ele
coloca grande importância na afetividade. E reafirma sua teoria, ao dizer que:
“Ela incorpora de fato as construções da inteligência, e, por conseguinte
tende-se racionalizar. As formas adultas de afetividade, por esta razão,
podem diferir enormemente das suas formas infantis.”
(DANTAS, apud, LA TAILLE, 1992, p.90)
Como se percebe, a afetividade é de suma importância desde o início do
desenvolvimento humano. As mudanças no homem vão acontecendo de acordo
com o seu meio e com as pessoas à sua volta, familiares, amigos e professores.
O afeto deve estar presente na relação entre professor e alunos dentro do
ambiente escolar. É de acordo com o grau de afeto apresentado entre as duas
partes que a interação se realiza e constrói-se um conhecimento altamente
envolvente.
Conforme CURY (2003) os professores precisam deixar de serem bons e se
tornarem fascinantes para que suas aulas e conteúdos façam sentido e possam ser
assimilados por seus alunos.
A confiança é tudo para os alunos, é uma ferramenta para a participação no
sucesso e na conquista de seu educando. O professor é o referencial, o líder, o que
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
9
orienta e auxilia o aluno em suas atividades, seus sonhos e projetos. Por outro lado,
o professor também cresce e se realiza quando percebe que conseguiu passar todo
o ensinamento para o aluno de uma forma tranquila, com amizade e serenidade,
sem castigos, sem punições. O professor tem que estar apto para construir, se
dedicar aos alunos, vibrando com suas conquistas.
Para FREIRE (1996) "... quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é
formado forma-se e forma ao ser formado", confirmando a necessidade de uma
educação global, visando o completo desenvolvimento do indivíduo e a
compreensão do docente de que o processo de ensino e aprendizagem não está
centrado no conhecimento do professor, mas que deve ser construído e produzido a
partir da interação deste com o educando. A criança deve ser estimulada em todas
as habilidades e, para isso, o professor deve estar ciente de que ensinar é uma
especificidade humana, não é transferir conhecimento, e exige a participação de
todos os segmentos envolvidos.
A relação entre professor e aluno depende, fundamentalmente, do clima
estabelecido pelo professor, da relação empática com seus alunos, de sua
capacidade de ouvir, refletir e discutir o nível de compreensão dos alunos e da
criação das pontes entre o seu conhecimento e o deles. Indica também, que o
professor, deve buscar educar para as mudanças, para a autonomia, para a
liberdade possível numa abordagem global, trabalhando o lado positivo dos alunos e
para a formação de um cidadão consciente de seus deveres e de suas
responsabilidades sociais.
4. Considerações Finais
Todas as relações quer sejam familiares, profissionais ou pessoais, devem
ser permeadas pela afetividade, e esta pode ser validada por todos, em qualquer
faixa etária e em qualquer nível social e cultural.
A afetividade está sempre presente nas experiências vividas pelas pessoas,
no relacionamento com o outro, por toda a vida, desde seu nascimento.
Todo ser humano precisa de limites, mas de carinho e amor também. Um
educando aprende o que é respeito e respeita a partir do momento em que vê o
educador como um amigo que tem e espera respeito, como alguém que se
preocupa de verdade com ele e que lhe mostra os caminhos.
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
10
Nota-se claramente que a afetividade é fundamental para a vida humana e
que representa um dos aspectos mais significativos na construção de pessoas mais
saudáveis, mais capazes de tomar decisões sábias e inteligentes, principalmente a
importância que tem a afetividade na vida da criança e como essa relação vai
influenciar não só na sua formação, mas em toda sua vida adulta, sua relação com
o mundo.
Acreditamos que os aspectos afetivos e cognitivos formam um par
inseparável. No interior da vida escolar, principalmente na Educação Infantil, os
alunos precisam vivenciar momentos que potencialmente geram crescimento, que
vão ter implicações afetivamente marcantes em seu desempenho pedagógico.
Numa época de crises, tragédias e separações como a nossa, é necessário
começarmos a pôr em prática nas escolas, idéias mais humanistas, que valorizem
desde cedo a importância das emoções.
Concluindo, as instituições escolares, e neste caso específico, as de
Educação Infantil, devem ser sempre um lugar de investigação por parte do
professor de sua própria prática pedagógica. Devem ser também, um espaço
dinâmico e vivo, no qual as crianças alcancem o pleno desenvolvimento de suas
capacidades e potencialidades corporais, cognitivas, afetivas, emocionais, éticas, de
relação interpessoal e inserção social. As instituições de Educação Infantil que
primam pela qualidade da educação e propiciam interações sociais afetivas,
contribuem para a formação de crianças saudáveis, inteligentes e, acima de tudo,
felizes.
Referências Bibliográficas
ARANTES, Valéria Amorim. et al. Afetividade na escola: alternativas teóricas e
práticas. São Paulo: Summus, 2003.
CURY, Augusto Jorge. Pais brilhantes, professores fascinantes. Rio de Janeiro:
Sextante, 2003.
DICIONÁRIO AURÉLIO. Novo dicionário da língua portuguesa. Editora Nova
Fronteira. 1 cd-rom. 1994.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. 9º ed.- São Paulo: Paz e Terra, 1996. - (coleção leitura)
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
11
GOULART, Iris Barbosa. PIAGET- Experiências básicas para utilização pelo
professor. Petrópolis: Editora Vozes, 2003.
KRAMER, Sonia. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. Rio de
Janeiro: Achiamé, 1992.
MENEGHETTI, Antonio. Nota sobre “afetividade” in manual de ontopsicologia.
Agência Financiadora: Não contou com financiamento
Resumo
O tema desta comunicação – as funções sociais da escola – é resultante de uma pesquisa de
cunho bibliográfico desenvolvida na disciplina Ciência, História e Educação. Tem por
objetivo identificar as funções sociais da escola sob a perspectiva de cinco autores. Com esse
intuito, analisamos o artigo de Pierre Bourdieu (1999) – A Escola Conservadora: as
desigualdades frente à escola e à cultura – no qual o autor explicita os mecanismos objetivos
que determinam a função social da escola sob a ótica da conservação das desigualdades e da
reprodução das classes sociais; a obra de Pérez Gómez (1998) – As Funções Sociais da
Escola: da reprodução à reconstrução crítica do conhecimento e da experiência – que vê, na
escola, um espaço no qual a função reprodutivista pode ser quebrada pela priorização da
função educativa; Dermeval Saviani em Educação: do senso comum à consciência filosófica
(1980) e Escola e Democracia (1983) destaca que a função social da escola é promover o
homem, elaborando, a partir daí, um método que permitiria à escola exercer tal função.
Antonio Gramsci (1979) em Os Intelectuais e a Organização da Cultura propõe a escola
unitária e desinteressada. Com A Produção da Escola Pública Contemporânea Gilberto Luiz
Alves (2001) demonstra como as funções reprodutivista e pedagógica foram secundarizadas,
cedendo espaço a novas funções. Embora os caminhos metodológicos seguidos por estes
pensadores sejam, em alguns casos, divergentes, suas análises convergem, sob uma dimensão:
a escola deve resgatar o conhecimento historicamente acumulado e assumir a função de
possibilitar, aos trabalhadores, o acesso a esse conhecimento.
Palavras-chave: Função Social da Escola. Reprodução e Conservação Social.
Transformação. Promoção do Homem. Escola Única e Desinteressada.
1314
Introdução
Esse estudo tem por objetivo identificar as funções sociais da escola sob as lentes de
cinco historiadores: Pierre Bourdieu (1999), Pérez Gómez (1998), Dermeval Saviani (1980,
1983), Antônio Gramsci (1979, 1989) e Gilberto Luiz Alves (2001). Este trabalho é o
resultado de uma pesquisa bibliográfica realizada na disciplina Ciência, História e Educação1
que buscou responder à seguinte questão: quais as funções sociais que permearam o
desenvolvimento da escola pública? Entender essas funções implicou nessa pesquisa
bibliográfica com o objetivo de explicitar as funções sociais da escola sob a lente de
diferentes autores.
O sociólogo francês, Pierre Bourdieu, explicita, em seu artigo, os mecanismos
objetivos que determinam a função social da escola: conservar as desigualdades e reproduzir
as classes sociais. Pérez Gómez também afirma que a escola é conservadora e reprodutora,
contudo acredita que ela pode ser, além disso, um espaço de transformação.
Dermeval Saviani (1980, 1983) atribui à escola a função de promover o homem e,
nessa perspectiva, propõe melhorias profundas na formação docente e no ensino discente.
Para tanto desenvolveu um método de ensino para as escolas brasileiras no qual a apropriação
do conhecimento historicamente acumulado é o ápice.
Antônio Gramsci (1979, 1989) propõe uma escola unitária e desinteressada, uma
escola que não aja de forma imediatista, mas desinteressadamente, conduzindo o aluno ao
hábito de estudar, analisar, raciocinar e abstrair.
Preconizando uma nova didática, Gilberto Luiz Alves (2001) demonstra como as
funções reprodutivista e pedagógica foram secundarizadas na escola cedendo espaço às novas
funções geradas pelo desenvolvimento tecnológico.
A Escola Conservadora
Para Bourdieu (1999, p. 41) o sistema escolar “é um dos fatores mais eficazes de
conservação social, pois fornece a aparência de legitimidade às desigualdades sociais, e
sanciona a herança cultural e o dom social tratado como dom natural”. Conforme Bourdieu
1
Disciplina ministrada no segundo semestre de 2007, pelos professores Ângela Mara de Barros Lara e Mário
Luiz Neves de Azevedo, no Programa de Pós – Graduação em Educação/Doutorado, pela Universidade Estadual
de Maringá – UEM, da qual participei como aluna especial.
1315
(1999, p. 41/42), é a herança cultural a primeira responsável pela diferença inicial da criança
na escola, uma vez que cada família transmite a seus filhos certo capital cultural e certo ethos
– sistema de valores – que contribui para definir, entre outras coisas, as atitudes face ao
capital cultural e à instituição escolar. Assim, quanto mais elevada for a categoria sócio-
profissional e, conseqüentemente, o nível cultural dos pais e dos avós, mais se elevam as
probabilidades de êxito escolar da criança.
Não é só a compreensão e o manejo da língua que garantem maior rentabilidade
escolar aos filhos das classes superiores, afirma Bourdieu. Eles herdam, além dos saberes,
gostos e “bom gosto” – práticas e conhecimentos culturais (teatro, museu, pintura, música,
jazz, cinema) – tão mais ricos e extensos quanto mais elevada for sua origem social. E a
escola, pelas desigualdades de seleção e pela ação homogeneizante, só faz reduzir
minimamente essas diferenças, contribuindo para a reprodução da “estrutura das relações de
classe ao reproduzir a desigual distribuição, entre as classes, do capital cultural”
(BOURDIEU, 1975, p. 198). Ao atribuir aos indivíduos esperanças de vida escolar
estritamente dimensionadas pela sua posição social, a escola opera uma seleção que sanciona
e consagra as desigualdades reais. Com isso, contribui para perpetuar as desigualdades, ao
mesmo tempo em que as legitima.
A herança cultural, dada pela posição social, influencia tanto a taxa de êxito escolar e
a continuidade do ensino quanto a escolha do destino. No entanto, alerta Bourdieu (1999),
essa situação não se deve ao dom natural ou a um destino determinado, mas às desigualdades
sociais que geram as desigualdades culturais. Se a combinação do capital cultural e do ethos,
legados pelo meio familiar, constituem o princípio de eliminação diferencial das crianças de
diferentes classes sociais, é a atitude da família a respeito da escola que determina o
prosseguimento ou não dos estudos. As vantagens e desvantagens sociais são,
progressivamente, convertidas em vantagens e desvantagens escolares. Ao tratar todos os
educandos como iguais em direitos e deveres, a escola sanciona as desigualdades iniciais
frente à cultura e “consegue tão mais facilmente convencer os deserdados que eles devem seu
destino escolar e social à sua ausência de dons e de méritos” (BOURDIEU, 1975, p.218). Para
Bourdieu (1999, p. 53), a igualdade formal que pauta a prática pedagógica mascara a
indiferença frente às desigualdades reais e dirige-se tão somente aos educandos que detêm
uma boa herança cultural, de acordo com as exigências culturais da escola.
1316
Isso ocorre porque a cultura escolar é tão próxima da cultura da elite que as crianças
das classes populares não podem adquirir, senão com muito esforço, o que é herdado, pelos
filhos das classes cultivadas. Assim, a função da escola – organizar o culto de uma cultura –
só pode ser proposta a todos, mas, de fato, está reservada aos membros das classes às quais
pertence a cultura cultuada. Nesse contexto, a escola assume por função objetiva conservar os
valores que fundamentam a ordem social dominante. A essa prática cultural se oporia
[...] uma pedagogia racional e universal, que, partindo do zero e não considerando
como dado o que apenas alguns herdaram, se obrigaria a tudo a favor de todos e se
organizaria metodicamente em referência ao fim explícito de dar a todos os meios de
adquirir aquilo que não é dado, sob a aparência de dom natural, senão às crianças
das classes privilegiadas (BOURDIEU, 1999, p. 53).
No entanto, a ação da escola não se dirige no sentido de dar a todos os meios de
adquirir aquilo que não lhes é dado. Ela é o lugar de transmissão do saber que recebe e trata
os alunos como iguais, a despeito da disparidade cultural. Com isso sanciona as desigualdades
que só ela poderia reduzir. Considerando que o domínio da cultura erudita requer o
conhecimento do código segundo o qual ela está codificada e que o domínio do código só
pode ser adquirido mediante uma aprendizagem metódica e organizada caberia à instituição
escolar “desenvolver em todos os membros da sociedade, sem distinção, a aptidão para
práticas culturais que a sociedade considera como as mais nobres” (BOURDIEU, 1999, p.
62).
Bourdieu analisa a função reprodutivista da escola que, embora aja no sentido de
conservar as desigualdades e reproduzir as classes sociais, poderia ser também um espaço de
socialização caso lutasse por um trabalho no qual oferecesse aos filhos das classes populares
condições de adquirir o capital cultural que não herdaram. Porém, o autor francês considera
ingenuidade supor que do funcionamento da escola, tal como está organizada, possam surgir
as contradições capazes de determinar uma transformação profunda “e de impedir a
instituição encarregada da conservação e da transmissão da cultura legítima de exercer suas
funções de conservação social” (BOURDIEU,1999, p. 58).1317
3 Conservação e Reprodução ou Transformação?
Conforme Pérez Gómez (1998, p. 13), o ser humano, desde suas origens, elabora
mecanismos para sua sobrevivência que são transmitidos às novas gerações. “Este processo
de aquisição por parte das novas gerações das conquistas sociais – processo de socialização –
costuma denominar-se genericamente como processo de educação”. Nesse sentido, a
educação assume a função de socialização e, em especial, de humanização do homem. Nas
sociedades atuais a preparação das novas gerações está sob a responsabilidade de instâncias
específicas como a escola, cuja função é preparar as “novas gerações para sua participação no
mundo do trabalho e na vida pública” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 13), ou seja, promover sua
socialização.
A escola, concebida como instituição socializadora das novas gerações, cumpre uma
função puramente conservadora: “garantir a reprodução social e cultural como requisito para a
sobrevivência da sociedade” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 14). No entanto, alerta o autor, a
tendência conservadora lógica para a reprodução social choca-se com outra tendência,
também lógica, que busca transformar os caracteres sociais, especialmente aqueles
desfavoráveis para alguns grupos, caracterizando uma contradição externa. Nesse contexto, o
processo de socialização que a escola cumpre assume dois objetivos: preparar os alunos para
o futuro ingresso no mercado de trabalho e formar o cidadão para sua intervenção na vida
pública, emergindo daí as contradições internas que consagram a escola como reprodutora da
arbitrariedade cultural. Explica-se.
Com o intuito de formar o cidadão capaz de intervir na vida pública a escola deve
provocar o desenvolvimento de conhecimentos, idéias, atitudes e pautas que permitam sua
incorporação na vida política e social, esferas que requerem “participação ativa e responsável
de todos os cidadãos considerados por direito como iguais” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 20).
Contraditoriamente essa mesma sociedade, na esfera econômica, induz à submissão, à
disciplina e à aceitação das diferenças sociais. Nessa esfera a contradição agrava-se: a escola
deve formar os alunos para sua futura incorporação em que mercado de trabalho? Do trabalho
assalariado que requer submissão e disciplina? Ou do trabalho autônomo que, ao contrário,
requer atividade e criatividade?
Frente a uma função tão complexa e contraditória a escola apresenta
1318
[...] uma ideologia tão flexiva, frouxa e eclética [...] cujos valores são o
individualismo, a competitividade, a falta de solidariedade, a igualdade formal de
oportunidades e a desigualdade “natural” de resultados em função de capacidades e
esforços individuais. Assume-se a idéia de que a escola é igual para todos e de que,
portanto, cada um chega onde suas capacidades e seu trabalho pessoal lhes permitem
(PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 16).
Esse processo consagra a escola como reprodutora da arbitrariedade cultural num meio
que estimula a competitividade, em detrimento da solidariedade, desde os primeiros
momentos da aprendizagem escolar. Confirmando os dizeres de Bourdieu, Pérez Gómez
(1998, p. 16) conclui que a escola socializa preparando o cidadão para aceitar como natural a
arbitrariedade cultural. Porém, o processo de reprodução nem é linear, nem automático, nem
isento de contradições e resistências; o processo de socialização acontece também em
conseqüência das práticas sociais. A escola é um cenário de conflitos.
Para Pérez Gómez (1998, p. 19) na escola, como em qualquer outra instituição social,
existem espaços de relativa autonomia que podem ser usados para desequilibrar a tendência
reprodutora, uma vez que o processo de socialização envolve um complexo movimento de
negociação em que as reações e resistências de professores/as e alunos/as podem chegar a
provocar a recusa e ineficiência das tendências reprodutoras da escola.
A contradição externa – tendência conservadora x tendência renovadora – acontece de
forma específica na escola. As correntes renovadoras impulsionam a resistência e a
transformação. A função educativa da escola, ou seja, a utilização do conhecimento social e
historicamente construído, da experiência e da reflexão como ferramentas de análise para
compreender a sociedade e a ideologia dominante, quebra ou pode quebrar o processo
reprodutivista. O grande desafio da escola é fazer com que sua função educativa assuma um
caráter compensatório, isto é, atenda às diferenças de origem, oportunizando o acesso à
cultura, provocando e facilitando a reconstrução dos conhecimentos, das disposições e das
pautas de conduta que a criança assimila em sua vida paralela e anterior à escola.
A escola, afirma o autor, não pode anular a desigualdade socioeconômica, mas pode
atenuar seus efeitos. Para tanto, deve oferecer o conhecimento como ferramenta de análise e,
mais que transmitir informação, deve orientar
1319
[...] para provocar a organização racional da informação fragmentaria recebida e a
reconstrução das pré-concepções acríticas formadas pela pressão reprodutora do
contexto social. [...] É preciso transformar a vida da aula e da escola, de modo que
se possam vivenciar práticas sociais e intercâmbios acadêmicos que induzam à
solidariedade, à colaboração, à experimentação compartilhada, assim como a outro
tipo de relações com o conhecimento e a cultura que estimulem a busca, a
comparação, a crítica, a iniciação e a criação (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 26).
Assim como Bourdieu, Pérez Gómez afirma que a escola exerce uma função de
reprodução cultural e de conservação social. Porém, ele acredita na existência de um espaço
de autonomia no qual a resistência pode gerar transformações. Além da função de
conservação e de reprodução a escola pode, através de sua função educativa, estimular a
participação ativa e crítica dos alunos, primeiramente nas atividades desenvolvidas na sala de
aula e, posteriormente no cenário social propriamente dito.
A Escola como Promotora do Homem
A Importância da Afetividade na Relação Professor/Aluno no
Processo de Ensino/Aprendizagem na Educação Infantil
Tágides Mello 1
2
Juliana de Alcântara Silveira Rubio
Resumo
Este trabalho pretende abordar a afetividade como
fator imprescindível no processo de ensino
aprendizagem, pois age de forma positiva na vida
educacional. Através do afeto, o aluno adquire
todas as condições necessárias para se sentir
seguro e protegido. Assim, para que tenha um
desenvolvimento saudável e adequado dentro do
ambiente escolar é necessário estabelecer
relações positivas, para se atingir os objetivos
educativos.
Palavras Chave: Afetividade; relação professor-aluno; aprendizagem.
1. Introdução
Esta pesquisa trata da importância da afetividade para os educandos da
Educação Infantil, por entender que o indivíduo que é tratado com afeto pode
transformar-se em um ser humano capaz de enfrentar os problemas da vida e tem
maior possibilidade de tornar-se uma pessoa mais solidária, mais centrada. Nesse
contexto observamos também que o educador tem que fazer sua parte, procurando
estar emocionalmente equilibrado, para poder intervir nos conflitos que surgem em
sua sala de aula. Um bom relacionamento entre professor e aluno, pautado no
respeito e no carinho favorece essa mediação.
Ao perceber a importância de uma relação afetiva positiva entre professor-
aluno para o processo e desenvolvimento da aprendizagem da criança, sentimos a
necessidade de desenvolver uma pesquisa a fim de verificar se o fortalecimento das
relações afetivas entre ambos contribui para um melhor rendimento escolar.
Acreditamos que o professor não apenas transmite conhecimentos, mas também
pode estabelecer uma relação afetiva com seus alunos, o que facilitaria o processo
de aprendizagem.
1
Pós-graduando em Psicopedagogia pela Universidade Nove de Julho – UNINOVE.
2
Mestre em Educação pela Universidade Estadual Paulista – UNESP – Professora orientadora.
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
2
O trabalho foi baseado em autores como Freire (1996), Piaget (1995), La
Taille (1992), Saltini (2008), e subsidiado por várias citações destes autores, mestres
na arte de educar.
2. Afetividade
Uma das dificuldades no estudo sobre a afetividade é a definição do que
realmente significa o termo. Na linguagem geral, afeto relaciona-se com sentimentos
de ternura, amor, carinho e simpatia. A afetividade está relacionada aos mais
diversos termos: emoção, estados de humor, motivação, sentimento, paixão,
atenção, personalidade, temperamento e outros tantos. A maior parte das vezes,
confundida com emoção.
A afetividade exerce um papel importantíssimo em todas as relações, além de
influenciar decisivamente a percepção, o sentimento, a memória, a autoestima, o
pensamento, a vontade e as ações, e ser, assim, um componente essencial da
harmonia e do equilíbrio da personalidade humana.
Os estados afetivos fundamentais são as emoções, os sentimentos, as
inclinações e as paixões. A palavra emoção vem do latim movere, mover-se para
fora, externalizar-se. É a máxima intensidade do afeto.
A emoção é definida assim, pelo Dicionário Aurélio (1994): “Psicol. Reação
intensa e breve do organismo a um lance inesperado, a qual se acompanha de um
estado afetivo de conotação penosa ou agradável”.
Segundo a Wikipédia, “a afetividade é a relação de carinho ou cuidado que se
tem com alguém íntimo ou querido”. É o estado psicológico que permite ao ser
humano demonstrar as suas emoções e sentimentos a outro ser. É considerado
também o laço criado entre humanos com uma amizade mais aprofundada.
Afeição (vinda de afeto), é representada por um apego a alguém, o que gera
carinho, saudade, confiança e intimidade, o termo perfeito para amor entre duas
pessoas. O afeto é um dos sentimentos que mais gera autoestima entre pessoas.
Afeto significa afeição; amizade; amor e designa um estado da alma, um
sentimento; é uma mudança ou modificação que ocorre simultaneamente no corpo
e na mente de alguém. A maneira como somos afetados pode diminuir ou aumentar
a nossa vontade de agir.
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
3. A Afetividade na Educação Infantil
Para que se possa compreender de forma mais ampla o tema da afetividade
na educação infantil, entendemos que primeiramente faz-se necessário tratar
rapidamente sobre a educação infantil.
A Educação Infantil foi vista durante um grande tempo como uma forma de
cuidar, sendo assim deixada em segundo plano, não contando com nenhuma
preocupação no que diz respeito ao caráter pedagógico que está inserido em todo
contexto educacional.
Porém, atualmente, muito se discute sobre Educação Infantil. A Educação
Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança. Conforme a LDB- Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei Federal nº 9394/96)- colocando-a na mesma importância com o Ensino
Fundamental e Médio. Sobre a Educação Infantil, especificamente, a LDB se
expressa assim:
“A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
ação da família e da comunidade.” (LDB, CAP.II; SEÇÃOII; ART.29- LDB)
Falando de qualidade na educação infantil, como já vimos, a questão da
afetividade passa a fazer parte da rotina e cotidiano educacional. Estudos realizados
deixam claro que a afetividade está ligada intimamente ao aprendizado infantil,
sendo que as emoções e os sentimentos foram muito estudados por importantes
teóricos.
Segundo La Taille (1992), Jean Piaget (1896-1980) foi um dos primeiros
autores que questionou as teorias sobre a afetividade e a cognição como aspectos
funcionais separados. Para Jean Piaget, “o desenvolvimento intelectual é
considerado como tendo dois componentes: o cognitivo e o afetivo”. Paralelo ao
desenvolvimento cognitivo está o desenvolvimento afetivo. Afeto inclui sentimentos,
interesses, desejos, tendências, valores e emoções em geral. Conforme Piaget
(1995) elas são inseparáveis, pois, defende que toda ação e pensamento
comportam um aspecto cognitivo, representado pelas estruturas mentais, e um
aspecto afetivo, representado por uma energética, que é a afetividade. Ou seja, “a
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
4
afetividade constitui aspecto indissociável da inteligência, pois ela impulsiona o
sujeito a realizar as atividades propostas”. Segundo La Taille (1992) “os educandos
alcançam um rendimento infinitamente melhor quando se apela para seus interesses
e quando os conhecimentos propostos correspondem às suas necessidades”.
Vygotsky (apud LA TAILLE, 1992), propôs a construção de uma nova
psicologia, fundamentada no materialismo histórico e dialético. Aprofundou seus
estudos sobre o funcionamento dos aspectos cognitivos, mais precisamente as
funções mentais e a consciência. Vygotsky usa o termo função mental para referir-
se a processos como pensamento, memória, percepção e atenção. A organização
dinâmica da consciência aplica-se ao afeto e ao intelecto.
Conforme Oliveira (1992, p. 76), Vygotsky explica que o pensamento tem sua
origem na esfera da motivação, a qual inclui inclinações, necessidades, interesses,
impulsos, afeto e emoção. Nesta esfera estaria a razão última do pensamento e,
assim, uma compreensão completa do pensamento humano só é possível quando
se compreende sua base afetivo-volitiva. Apesar de a questão da afetividade não
receber aprofundamento em sua teoria, Vygotsky evidencia a importância das
conexões entre as dimensões cognitiva e afetiva do funcionamento psicológico
humano, propondo uma abordagem unificadora das referidas dimensões.
Por sua vez, na psicogenética de Henri Wallon (apud LA TAILLE 1992), a
dimensão afetiva está no centro de tudo, tanto do ponto de vista da construção da
pessoa quanto do conhecimento. Para ele, a afetividade é fator fundamental no
desenvolvimento da pessoa, é por meio dela que o aluno exterioriza seus desejos e
suas vontades.
Desde pequeno, recém nascido, o ser humano utiliza a emoção para
comunicar-se com o mundo. O bebê, antes mesmo da aquisição da linguagem,
estabelece relação com a mãe, através de movimentos de expressão, choro, que é
uma produção cultural, e os movimentos e gestos são carregados de significados
afetivos, sendo expressões da necessidade alimentar e do humor.
Como diz Dantas (1992), para Wallon, “O ato mental se desenvolve a partir do
ato motor; personalismo ocorre dos três aos seis anos”. Nesse estágio desenvolve-
se a construção da consciência de si mediante as interações sociais, reorientando o
interesse das crianças pelas pessoas.
Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 4 – nº 1 - 2013
5
Henri Wallon foi o primeiro a levar não apenas o corpo da criança, mas
também suas emoções, para dentro da sala de aula. Suas idéias foram baseadas
em quatro elementos básicos que se comunicam o tempo todo: a afetividade, o
movimento, a inteligência e a formação do eu como pessoa.
Segundo Wallon (apud DANTAS,1992), a afetividade é anterior ao
desenvolvimento, e as emoções têm papel predominante no desenvolvimento da
pessoa, é por meio delas que o aluno exterioriza seus desejos e suas vontades. As
transformações fisiológicas de uma criança revelam traços importantes de caráter e
personalidade. A raiva, a alegria, o medo, a tristeza têm funções importantes na
relação da criança com o meio, a emoção causa impacto no outro e tende a se
propagar no meio social, pois é altamente orgânica. Desta forma, nessa teoria,
acredita-se que a afetividade é um ponto de partida para o desenvolvimento do
indivíduo.
Wallon destaca a alternância existente entre as funções razão (cognitiva) e
emoção (afetividade), apresentadas no decorrer do desenvolvimento da pessoa. A
razão e a emoção estão imbricadas, ou seja, uma não acontece sem a outra, mas
sempre uma se sobrepõe à outra.
Dantas (1992) enfatiza que, além de ser uma das dimensões da pessoa, a
afetividade é também a mais arcaica fase do desenvolvimento. Afirma que no início
da vida, afetividade e inteligência estão misturadas com predomínio da primeira.
Conclui que o ser humano, desde o nascimento, é um ser afetivo, e que
gradativamente, esta afetividade inicial vai diferenciando-se em vida racional.
Wallon, Vygotsky e Piaget afirmam que não se pode separar afetividade e
cognição. Apontando os estudos feitos por eles, pode-se afirmar que a afetividade é
vital em todos os seres humanos, de todas as idades, mas, especialmente, no
desenvolvimento infantil. A afetividade está sempre presente nas experiências
vividas pelas pessoas, no relacionamento com o “outro social”, por toda sua vida,
desde seu nascimento.
Quando a criança entra na escola, torna-se ainda mais evidente o papel da
afetividade na relação professor-aluno.
4. A Afetividade na Relação Professor-Aluno
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Educar não significa apenas repassar informações ou mostrar um caminho a
trilhar que o professor julga ser o certo. Educar é ajudar o aluno a tomar consciência
de si mesmo, dos outros, da sociedade em que vive e o seu papel dentro dela. É
saber aceitar-se como pessoa e principalmente aceitar ao outro com seus defeitos e
qualidades.
Muitos autores vêm, ao longo da história, defendendo que o afeto é
indispensável para o ato de ensinar. Embora os fenômenos afetivos sejam de
natureza subjetiva, isso não os torna independentes da ação do meio sóciocultural,
pois pode-se afirmar que estão diretamente relacionados com a qualidade das
interações e relações entre sujeitos, enquanto experiências vivenciadas.
Rubem Alves (2000) enfatiza que o professor, aquele que ensina com alegria,
que ama sua profissão, não morre jamais. Ele diz:
“Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a
viver naquele cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa
palavra. O professor, assim, não morre jamais...” (ALVES, 2000 p.5)
Em sala de aula tenta-se descobrir qual é o papel do professor, direcionando
o olhar para a relação que se desenvolve entre professor e aluno.
As interações em sala de aula são construídas por um conjunto de variadas
formas de atuação, que se estabelecem entre partes envolvidas, a mediação do
professor em sala de aula, seu trabalho pedagógico, sua relação com os alunos,
tudo faz parte desse papel. A afetividade não se limita a carinho físico, muitas vezes
se dá em forma de elogios superficiais, ouvir o aluno, dar importância às suas idéias.
É importante destacar essa forma de afetividade, pois às vezes nem percebemos
que pequenos gestos e palavras são maneiras de comunicação afetiva.
SILVA (2001) enfatiza a importância do professor para que os alunos sintam-
se mais seguros, criando, assim, um ambiente de aprendizado tranquilo, pois a
afetividade se faz presente no cotidiano da sala de aula, seja pela postura do
professor, pela dinâmica de seu trabalho ou nas interações entre sujeitos.
Todas as ações são mediadas pela afetividade do professor e percebe-se que
as decisões tomadas por ele têm respaldo da afetividade, constituindo o afeto como
fator fundante das relações que se estabelecem entre os alunos, os conteúdos
escolares e os professores.
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O ato de ensinar e de aprender envolve e exige certa cumplicidade do
professor, tal cumplicidade se constrói nas intervenções, através do que é falado, do
que é entendido, do que é transmitido e captado. Cabe ao professor planejar e
executar suas aulas para que seus alunos criem vínculos positivos entre si e os
conteúdos. Quando um professor apenas transmite um conteúdo, sem nexo, sem
que o aluno assimile afetivamente o conteúdo, nada será aprendido pois o professor
tem de tornar os conteúdos interessantes aos olhos dos alunos.
Pequenos gestos como sorrir, escutar, refletir, respeitar são, entre tantos
outros, necessidades que levam o sujeito a investir na afetividade, que é o
“combustível” necessário para a adaptação, a segurança, o conhecimento e o
desenvolvimento da criança.
Em se tratando da educação infantil, a relação do professor com os alunos é
constante, dá-se o tempo todo, na sala, durante as atividades, no pátio, e por essa
proximidade afetiva é que se dá interação com objetos e a construção do
conhecimento.
SALTINI (2008, p.100) afirma que, “essa inter-relação é o fio condutor, o
suporte afetivo do conhecimento.”
O referido autor complementa:
“Neste caso, o educador serve de continente para a criança. Poderíamos
dizer, portanto, que o continente é o espaço onde podemos depositar
nossas pequenas construções e onde elas são acolhidas e valorizadas, tal
qual um útero acolhe um embrião. A criança deseja e necessita ser amada,
aceita, acolhida e ouvida para que possa despertar para a vida da
curiosidade e do aprendizado.” (SALTINI, 2008, p.100)
As experiências afetivas nos primeiros anos de vida são determinantes para
que a pessoa estabeleça padrões de conduta e formas de lidar com as próprias
emoções, a qualidade dos laços afetivos é muito importante para o desenvolvimento
físico e cognitivo da criança. A relação interpessoal positiva que o aluno constrói
com o professor, como aceitação e apoio, possibilita o sucesso dos objetivos
educativos.
Quando ocorrem explosões de raiva, o professor precisa ter muita habilidade
e paciência e seria ótimo manter um diálogo com o aluno, em que se possa perceber
o que está acontecendo, usando tanto o silêncio quanto o corpo. Conforme
recomenda Saltini (2008 p.102) compartilhar com os demais da classe os
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sentimentos que estão sendo evidenciados é dar oportunidade para a criança
colocar seus sentimentos na escola, não apenas sua inteligência.
O afeto é muito importante para que o profissional seja considerado um bom
professor e mais ainda, para que o aluno se sinta importante e valorizado. O
professor deve entender seus sentimentos, buscar soluções para as diversas
dificuldades que os alunos apresentam, preocupar-se com seus alunos por inteiro,
tendo sensibilidade para entendê-los, buscar ações que os valorizem, independente
de seu grau de desenvolvimento.
Nessa visão, a criança interioriza suas vivências, principalmente pelo contato
social com outras pessoas. Sendo assim, se seu círculo social tratá-la com carinho,
reconhecer seus direitos e se mostrar atencioso, a criança interiorizará um bem-
estar emocional, sentindo-se protegida e segura de seu espaço dentro do grupo.
Wallon (apud La Taille, 1992), em sua teoria da emoção, considera a
afetividade e inteligência fatores misturados, e defende que a educação da emoção
deve ser incluída entre os propósitos da ação pedagógica.
Esse estudioso analisou que no início da vida, a afetividade se sobressai. Ele
coloca grande importância na afetividade. E reafirma sua teoria, ao dizer que:
“Ela incorpora de fato as construções da inteligência, e, por conseguinte
tende-se racionalizar. As formas adultas de afetividade, por esta razão,
podem diferir enormemente das suas formas infantis.”
(DANTAS, apud, LA TAILLE, 1992, p.90)
Como se percebe, a afetividade é de suma importância desde o início do
desenvolvimento humano. As mudanças no homem vão acontecendo de acordo
com o seu meio e com as pessoas à sua volta, familiares, amigos e professores.
O afeto deve estar presente na relação entre professor e alunos dentro do
ambiente escolar. É de acordo com o grau de afeto apresentado entre as duas
partes que a interação se realiza e constrói-se um conhecimento altamente
envolvente.
Conforme CURY (2003) os professores precisam deixar de serem bons e se
tornarem fascinantes para que suas aulas e conteúdos façam sentido e possam ser
assimilados por seus alunos.
A confiança é tudo para os alunos, é uma ferramenta para a participação no
sucesso e na conquista de seu educando. O professor é o referencial, o líder, o que
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orienta e auxilia o aluno em suas atividades, seus sonhos e projetos. Por outro lado,
o professor também cresce e se realiza quando percebe que conseguiu passar todo
o ensinamento para o aluno de uma forma tranquila, com amizade e serenidade,
sem castigos, sem punições. O professor tem que estar apto para construir, se
dedicar aos alunos, vibrando com suas conquistas.
Para FREIRE (1996) "... quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é
formado forma-se e forma ao ser formado", confirmando a necessidade de uma
educação global, visando o completo desenvolvimento do indivíduo e a
compreensão do docente de que o processo de ensino e aprendizagem não está
centrado no conhecimento do professor, mas que deve ser construído e produzido a
partir da interação deste com o educando. A criança deve ser estimulada em todas
as habilidades e, para isso, o professor deve estar ciente de que ensinar é uma
especificidade humana, não é transferir conhecimento, e exige a participação de
todos os segmentos envolvidos.
A relação entre professor e aluno depende, fundamentalmente, do clima
estabelecido pelo professor, da relação empática com seus alunos, de sua
capacidade de ouvir, refletir e discutir o nível de compreensão dos alunos e da
criação das pontes entre o seu conhecimento e o deles. Indica também, que o
professor, deve buscar educar para as mudanças, para a autonomia, para a
liberdade possível numa abordagem global, trabalhando o lado positivo dos alunos e
para a formação de um cidadão consciente de seus deveres e de suas
responsabilidades sociais.
4. Considerações Finais
Todas as relações quer sejam familiares, profissionais ou pessoais, devem
ser permeadas pela afetividade, e esta pode ser validada por todos, em qualquer
faixa etária e em qualquer nível social e cultural.
A afetividade está sempre presente nas experiências vividas pelas pessoas,
no relacionamento com o outro, por toda a vida, desde seu nascimento.
Todo ser humano precisa de limites, mas de carinho e amor também. Um
educando aprende o que é respeito e respeita a partir do momento em que vê o
educador como um amigo que tem e espera respeito, como alguém que se
preocupa de verdade com ele e que lhe mostra os caminhos.
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Nota-se claramente que a afetividade é fundamental para a vida humana e
que representa um dos aspectos mais significativos na construção de pessoas mais
saudáveis, mais capazes de tomar decisões sábias e inteligentes, principalmente a
importância que tem a afetividade na vida da criança e como essa relação vai
influenciar não só na sua formação, mas em toda sua vida adulta, sua relação com
o mundo.
Acreditamos que os aspectos afetivos e cognitivos formam um par
inseparável. No interior da vida escolar, principalmente na Educação Infantil, os
alunos precisam vivenciar momentos que potencialmente geram crescimento, que
vão ter implicações afetivamente marcantes em seu desempenho pedagógico.
Numa época de crises, tragédias e separações como a nossa, é necessário
começarmos a pôr em prática nas escolas, idéias mais humanistas, que valorizem
desde cedo a importância das emoções.
Concluindo, as instituições escolares, e neste caso específico, as de
Educação Infantil, devem ser sempre um lugar de investigação por parte do
professor de sua própria prática pedagógica. Devem ser também, um espaço
dinâmico e vivo, no qual as crianças alcancem o pleno desenvolvimento de suas
capacidades e potencialidades corporais, cognitivas, afetivas, emocionais, éticas, de
relação interpessoal e inserção social. As instituições de Educação Infantil que
primam pela qualidade da educação e propiciam interações sociais afetivas,
contribuem para a formação de crianças saudáveis, inteligentes e, acima de tudo,
felizes.
Referências Bibliográficas
ARANTES, Valéria Amorim. et al. Afetividade na escola: alternativas teóricas e
práticas. São Paulo: Summus, 2003.
CURY, Augusto Jorge. Pais brilhantes, professores fascinantes. Rio de Janeiro:
Sextante, 2003.
DICIONÁRIO AURÉLIO. Novo dicionário da língua portuguesa. Editora Nova
Fronteira. 1 cd-rom. 1994.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. 9º ed.- São Paulo: Paz e Terra, 1996. - (coleção leitura)
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GOULART, Iris Barbosa. PIAGET- Experiências básicas para utilização pelo
professor. Petrópolis: Editora Vozes, 2003.
KRAMER, Sonia. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. Rio de
Janeiro: Achiamé, 1992.
MENEGHETTI, Antonio. Nota sobre “afetividade” in manual de ontopsicologia.
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